O Zorba era um cão fabuloso, nunca fazia nada à espera do osso. Eu até podia acabar aqui este texto e “postá-lo” mesmo assim, que ele não se chateava. Às vezes ficava horas nos degraus da sala a ver-me ver televisão. Era maior do que eu. Em tudo. Eu prendia-me a uma realidade. A dele incluía-me. Um dia, sem que nada o fizesse prever, pediu-me o divórcio. Não deu razões, mas bastou-me olhar para ele para ver que era coisa séria. Assinei os papéis sem pestanejar, mas cá por dentro estava como se o meu cão, o Zorba, me tivesse pedido o divórcio. Chorei dias e dias. Lágrimas, por acaso, não. Demorei anos a ultrapassar a dor de não o ter ali, comigo, a sublinhar o nada, que era o que eu fazia. A consciência de que, finalmente, estava pronto a amar de novo só me chegou há coisa de uma hora, quando dei com a Rela, que é a cadela da vizinha, a espreitar pela janela cá para dentro, vendo-me a ver televisão. Abri-lhe a porta, claro, e adoptei-a. Minutos depois, quem me aparece à janela? O Zorba! Estava a chegar de Marrocos, aonde foi engolir uns ovos de haxixe para vender cá, e vinha à procura dela, da Rela. Iam-se casar. Combinaram ali, na minha casa, porque ele queria que ela visse a estupidez de vida que ele teve durante tanto tempo, e também porque estava a dar o Herman. Eu senti um misto de tristeza e felicidade. Tristeza porque ficava sem pau nem bola. Felicidade porque já tinha quem partilhasse a minha tristeza: a vizinha.
terça-feira, 3 de julho de 2007
Subscrever:
Enviar feedback (Atom)
1 comentário:
Esta é a minha ilustração favorita.
Manuela
Enviar um comentário